domingo, 10 de julho de 2011

Não sei se vocês já fizeram isso,

mas correr por um shopping a procura de um garçom com olhos cor-de-rosa, com seu melhor amigo – que deveria se gay – gritando juras de amor atrás de você e com sua cabeça querendo explodir de tanta ressaca não é nada fácil.
            Principalmente se você está no Pátio Savassi.
            - Nina, espere!! – dizia Dan, enquanto eu passava por patricinhas e casaizinhos que olhavam para mim com espanto. – Meu amor, espere!
            Eu não estava correndo de verdade, claro que não. Eu apenas andava o mais rápido que meus óculos escuros mega-gigantes e meu medo dos seguranças me expulsarem me permitiam.
            - Nina!
            Mas o garçom estava correndo. Era a única explicação para o fato de, a cada esquina que eu virava ou andar que descia, seus cabelos loiros parecerem mais e mais distantes de mim, até finalmente chegar ao ponto dele desaparecer.
            Parei no primeiro andar, sentindo meu coração disparar e minha cabeça latejar continuamente. Um segundo depois, Dan me alcançou. Ele tomou minhas mãos nas suas e começou a declamar qualquer coisa sobre ‘destino’ e ‘amor eterno’, mas eu não prestava atenção. Minha cabeça estava naquele garçom esquisito, que eu ainda tentava achar entre a confusão de pessoas e vitrines.
            E naqueles olhos cor-de-rosa, do mesmo tom que os de Dan estavam agora.
O que aquilo significava?
            Provavelmente que eu estava louca, ou que o álcool ainda surtia efeito no meu corpo. Mas e se fosse outra coisa?
            Pensei naquela mancha em forma de coração nas sobrancelhas do garçom, e no choque elétrico que percorreu minhas veias no instante em que toquei sua mão.
Um instante depois de tocá-lo, Dan, o meu “amigo gay”, estava no chão fazendo juras de amor. Poderia ser muita paranóia da minha cabeça, mas não parecia haver outra explicação...
            Se eu estivesse certa, se desde ontem a noite eu estivesse certa em tudo, então eu acabara de conhecer o Cupido – e de perdê-lo no Pátio Savassi.
            E ele acabara de fazer meu amigo virar hétero. E se apaixonar por mim.
            Poderia ser até engraçado, se não fosse completamente assustador.
            - Minha Nina! Porque não me responde?
            - Oi? – disse, acordando dos meus pensamentos.
            - Me diz, Nina, Sol da minha vida. Você aceita?
            Olhei ao redor, para todas as pessoas que olhavam para nós como se fôssemos fugitivos do hospício.
            - Aceitar o quê?
            Dan grunhiu, frustrado, e então pareceu ter uma idéia brilhante. E quando eu dei por mim, Daniel Emmerson ficava de um joelho só na porta principal do Pátio Savassi, pegando minha mão direita, e dizendo, com a voz embargada de emoção: - Nina Marcela Carvalho Nunes, você aceita se casar comigo?
            Arregalei meus olhos enquanto o shopping inteiro sussurrava e ria da minha expressão.
            Ótimo. Meu primeiro pedido de casamento é feito por um cara que assina a revista Garanhões Sarados.
            - Daniel. Levante-se. Agora. – eu falei, meu rosto com toda certeza se transformando numa máscara avermelhada de vergonha.
            Ele me olhou confuso.
            - Isso é um sim?
            - Não isso não é um sim! – o puxei do chão e comecei a arrastá-lo para fora dali.  – Agora vamos embora Dan. Você não está sendo você mesmo.
            Mas não seria tão fácil assim.
            - É claro que estou sendo eu mesmo. – ele falou, parando no meio do caminho. Tentei puxá-lo de volta, mas eu não era páreo para a massa de dois metros e meio do meu amigo modelo.
            - É claro que você não está sendo você mesmo! Dan, acorda!
            Gritei, estalando os dedos sobre seus olhos rosa. Quem sabe ele não estava em algum tipo de transe e tudo que eu precisava fazer era acordá-lo?
            - Você é gay. Gay. Lembra? Seu namorado está numa turnê mundial. Você se vestiu de Lady Gaga no último Halloween, pelo amor de Deus. Você não me ama. Você só está confuso.
            Agora havia uma pequena platéia em volta de nós dois. Com toda certeza estávamos fazendo o maior sucesso, as pessoas até paravam suas compras para olhar para mim e Dan.
            - Não estou confuso. Eu tenho muita certeza do que estou dizendo, Nina. EU AMO VOCÊ.
            - Ok – disse, dando uma risada. – Se não acredita em mim, então abra sua carteira. Vamos, abra.
            Dan ergueu uma sobrancelha – parecendo um pouco com o Dan normal (exceto pelos olhos cor-de-rosa. E será que eu era a única a notar isso, aliás?) – mas fez o que pedi. E ele viu, enfiada dentro de uma das divisórias da carteira, a foto em que ele e seu namorado se beijavam loucamente, na festa após o Mtv Movie Awards que aconteceu na casa do Usher, há dois meses.
            Os olhos de Dan se arregalaram por um momento, virando rosa-shocking. Quando ele olhou de volta para mim, não sei por que, mas senti um leve calafrio.
            - Então é por isso que você não me aceita? Por causa de um beijo?
            - Acho que isso foi um pouco mais de um beijo. – falei.
            Primeiro eu pensei que finalmente tinha o convencido a parar com todo aquele lance de “Romeu e Julieta”. Daniel olhava da foto para mim, e de mim para a foto com uma expressão séria. E eu quase achei ter visto uma luz verde sobre o brilho cor-de-rosa em seus olhos.
            Mas então – claro – ele disse:
            - Se é por um beijo...
            E de repente, eu via Daniel Emmerson colocando suas mãos no meu rosto; e os lábios de Daniel Emmerson colando-se aos meus; e a língua de Daniel Emmerson juntando-se a minha. E então, na porta de um shopping de Belo Horizonte, Daniel Emmerson me beijou. Escandalosamente. Tipo novela das nove.
            Se foi estranho? Pra caralho. Quer dizer, eu já vi Dan beijando muitos caras antes. E já o vi beijando garotas também, mas mesmo assim.
            Se foi bom...?
            Bem, não vou mentir. Foi legalzinho, vai. Ok, foi bom. Tá bom, ta bom, foi ótimo ok, eu admito. Eu até coloquei minhas mãos em volta do seu pescoço.
            Hei, não olhe assim para mim! O cara era um modelo internacional. Ele não era gatinho não, ele era um deus grego. E admito que quando o conheci eu tinha uma grande queda por ele. Mas isso foi meio que superado depois de ver sua coleção de pôsteres do Leonardo DiCaprio, e de todas aquelas revistas dos Garanhões Sarados.
            Mas isso não apagava o fato de que ele era lindo. E nem de que ele beijava muito bem. Quer dizer, sei que é brega dizer isso, mas sua boca realmente parecia ser feita de veludo. E quanto a todo o resto... bem, vamos apenas dizer que não era só minha língua que estava curtindo aquele momento.
            Eu e Dan ficamos assim, nos beijando, e a coisa ficava cada vez melhor e melhor – se é que isso era possível. Não é a toa que o JB lá é amarradão pelo meu amigo. Provavelmente esse foi um dos melhores beijos que eu já tive... tirando um cara do Axé, que eu nem sei o nome... e teve outro também, que não tô me lembrando de onde que era... mas enfim, com toda certeza estava no top 5.
            E foi mais ou menos aí que eu comecei a me perguntar... qual era o problema? Quer dizer, sério. Qual era o problema?
            Tudo bem que era sacanagem porque o Dan estava namorando, e as pessoas certamente ficariam meio confusas. Mas e daí? Hoje em dia não existe mais essa coisa de homo e hétero... todo mundo gosta de todo mundo – não é mesmo?
            Então qual era o grande problema de eu simplesmente continuar beijando meu amigo ga... ex-gay, acho, e sei lá, ter um relacionamento com ele, talvez? Claro que eu não aceitaria o pedido de casamento, porque isso sim seria loucura. Mas quem sabe um namoro? Não seria algo ruim. Eu e Dan somos amigos há tanto tempo... e temos tanto em comum – e ok que ele é meio chato e super critico. Mas eu poderia relevar todas essas coisas... se ele apenas continuasse me beijando assim.
            Afinal, deve haver um motivo para o Cupido ter escolhido justamente o Dan para se apaixonar por mim. Talvez esse era o nosso destino. Talvez, desde o começo, nós éramos destinados a ficar juntos – tudo bem que eu que fiz o feitiço que teoricamente fez isso tudo acontecer mas...
            Eu só estou dizendo que isso tudo parecia certo, sabe? Principalmente se ele continuasse me beijando.
            Foi nesse exato momento que um flash branco explodiu no meu rosto, tão forte que se não fosse pelos óculos escuros, minha cabeça com toda certeza explodiria bem em cima do tapete da entrada do shopping. Eu me virei assustada e vi um homem baixo e gorducho segurando uma enorme câmera profissional, que disparava flash depois de flash, uma hora focando em Dan, outra hora em mim, e outra em nós dois.
            Um paparazzo. Eu descolei – com certa resistência, admito – minha boca da de Dan e me perguntei, ainda meio zonza, o quê um paparazzo estava fazendo tirando foto de mim e do meu futuro namorado?
            - Em, isso quer dizer que você e o JB terminaram?
            E foi aí que caiu a ficha.
            Ahhh é mesmo. Meu “futuro namorado” era uma celebridade. Que namorava outra celebridade.
            Que era um homem.
            Merda, o que diabos eu estava fazendo???
            Outro paparazzo apareceu aparentemente do nada, e esse tinha uma câmera e uma repórter que apontava o microfone para nós dois e fazias perguntas como: “Qual é seu nome?”, “Quantos anos você tem?”, “Como vocês se conheceram?”, “Isso quer dizer que você não é gay?”, e “Querida, o que exatamente você está vestindo?”.
            Ok, aquilo era o bastante. Enquanto eu ficava morta de vergonha e via mais pessoas e mais paparazzi se aproximando – e vendo Dan ocupado respondendo todas as perguntas e sorrindo para todas as fotos (era interessante saber que seu lado exibido não tinha sido afetado pelo feitiço) – eu comecei a me afastar discretamente, cobrindo meu rosto e caminhando para a calçada bem devagar. Não sei bem como, mas finalmente me vi atravessando rapidamente a rua, e me afastando o mais rápido possível daquele lugar. Por sorte, Dan não me seguiu. Acho que ele estava ocupado demais com seu outro amor – tão grande que nem o Cupido conseguira apagar: ele mesmo.
            Eu cheguei do outro lado da calçada, querendo simplesmente afundar minha cabeça no chão, quando trombei com alguma coisa grande e maciça, que me fez cair de bunda no chão na hora.
            Ergui meus olhos para a coisa que tinha me derrubado, me preparando para dizer todos os palavrões que me viessem à cabeça – minha bunda estava doendo à beça – quando percebi, sobre o sol da tarde, um cabelo loiro despenteado, um rosto lindo como um anjo, e um par de olhos pink.
            O Cupido, bem na minha frente.
            Eu não sabia exatamente o que dizer, mas com toda certeza não diria às palavras que saíram de sua boca um segundo depois:
            - Menina idiota.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

.Quando minha salada

– ah, quem estou tentando enganar? – quando minha lasanha de quatro queijos fumegante chegou, acompanhada do enorme prato de Dan (sério, era tão grande que nem dá para descrever) eu estava quase terminando meu monólogo sobre tudo que acontecera comigo e com Lena.
            Ou pelo menos eu tentava terminar. Era meio difícil fazer isso quando a pessoa com quem você está conversando faz questão de te interromper a cada duas frases para rir, erguer a sobrancelha ou comentar algo bem maldoso. Não que eu estivesse esperando algo diferente de Dan. Era só que... era bem irritante.
            Especialmente porque eu estava desesperada. Quer dizer, eu não tinha idéia do que faria agora. Eu e Lena, após horas olhando para aquele cupido queimado, não conseguimos chegar a nenhuma solução. A não ser que chamar um exorcista fosse uma solução – idéia de Lena. O que, claro, não era.
            Então lá estava eu, tentando pedir conselho para meu único amigo cínico o suficiente para ter uma visão inteligente sobre isso tudo, e ele ficava tirando uma com minha cara?
            Mas, como eu mesma disse: eu sabia que ele faria isso.
            - E aqui estou eu, morta de fome, com um cupido queimado escondido no meu armário, uma melhor amiga traumatizada e a sensação e que a qualquer momento um padre vai começar a jogar água benta em cima de mim.
            Terminei de falar e dei uma bela garfada na lasanha, temendo a reação final de Dan.
            Lena tinha me dito que o melhor era não contar nada a ele. E no fundo, no fundo eu sabia que provavelmente ela estava certa – principalmente depois de todos os risinhos sarcásticos da parte dele – mas o que eu podia fazer? Eu precisava de ajuda! Nem que fosse de um mala como o Dan.
            - Ok... – ele disse, depois de um tempo me olhando. A luz do sol refletia seus olhos claros. – Deixa ver se eu entendi.
            Suspirei profundamente e concordei com a cabeça.
            - O motivo pelo qual você me ligou toda dramática, dizendo que precisava da minha ajuda, e que algo muito sério tinha acontecido... e que eu deveria vir almoçar mais cedo... era só por causa disso?
            Meu queixo caiu.
- Como assim, só por causa disso? É por causa de tudo isso! Você não ouviu nada do monólogo que eu acabei de dizer?
            - Sim, ouvi, infelizmente, aliás. Você precisa aprender como contar uma história sem fazer as pessoas quererem enfiar o saleiro goela abaixo. Mas enfim; a única coisa que quero saber é: porque você tá levando tudo isso tão a sério?
            Ergui a sobrancelha, indignada. O que ele esperava que eu fizesse? Fingisse que eu não encontrei a réplica de um anjinho gorducho queimado no meu quarto? Ou simplesmente esquecer que eu fiz uma conta no site da Madame Dite, para mais informações sobre feitiços de amor (já devia ter uma dúzias de e-mails na minha caixa de entrada)?
            Ah, quem sabe eu não deveria apagar da minha memória aquele cheiro insuportável de mel com vodka?
            - Como você quer que eu leve – falei, me irritando cada vez mais – isso então, Dan?
            - Como qualquer pessoa de ressaca levaria? Simplesmente ignorando tudo.
            - Há! Eu já te disse isso que eu “tenho que ignorar” é um boneco carbonizado que ainda está no meu quarto, e isso sem falar no fato de que, caso não tenha sacado, eu e Lena fizemos um feitiço. Não dá para simplesmente ignorar isso.
            - Claro que dá. – Dan falou, rindo um pouco. Olha, pode ser preconceito ou qualquer coisa assim da minha parte, mas não existe nada pior do que um cara gay, gato e inteligente viu. Eu queria estrangular aquele garoto!
            - Posso saber como?
            - Gata – falou ele, se aproximando de mim, como se contasse um segredo – quantas ressacas você acha que moi já passou nessa vida, hein? Quantas vezes você acha que eu acordei ao lado de pessoas/objetos/bonecos/líquidos/lugares/animais/e roupas desconhecidas e sem ter a menor idéia do por que elas estavam ali? E às vezes sem nem saber do porque eu estava ali. Você fala que fez um feitiço... eu já devo, sei lá, ter escrito um romance espírita quando bebia (porque agora você sabe né, eu e o J estamos nessa campanha antialcool, porque faz bem para a imagem dele e tudo mais) mas quem disse que eu liguei?
            - Por mais maravilhoso que seja saber da sua vida de orgias alcoólicas por aí, isso é diferente. Nem eu nem Lena fazemos esse tipo de coisa toda hora. E ao contrário do que aparentemente você pensa, nós nos importamos com as coisas que fazemos quando estamos bêbadas... principalmente se elas envolverem um feitiço.
            - Ah, fala sério, você tá dando muita importância para isso tudo. Então você disse umas palavras mágicas – disse Dan, mexendo os dedos e engrossando a voz – para um pote com mel e um boneco dentro. Então você botou fogo nisso tudo e sentiu “uma coisa dentro do seu peito”. E daí? Não é como se isso fosse funcionar de verdade, você sabe.
            - Funcionou com minha prima. E com uma amiga minha.
            - Hum! Coincidência, fofa.
            - Coincidência? Então você tá querendo me dizer que não há nem a menor chance, nem a mais remota chance de um cara aparecer agora na nossa mesa, olhar nos meus olhos e dizer que me ama mais do que qualquer coisa nesse mundo, e que não faz a menor idéia do que porque disso?
            - Sim. – Dan falou, dando de ombros. –Ao menos que o cara estivesse falando comigo. Aí, é simplesmente compreensível.
            - Urgh!! Não acredito que perdi meu tempo vindo aqui conversar com você!
            Levantei-me da mesa, mesmo que meu prato ainda estivesse pela metade. Eu era muito retardada. Como achei que poderia ter aquela conversa com o Dan? Com o Dan?? De todas as pessoas, ele era o único que mais me julgaria por isso tudo.
            Eu não estava apenas irritada. Eu estava puta da vida. Quer dizer, já não basta eu estar de ressaca, estar comendo feito uma porca, e estar com uma macumba sinistra escondida no meu armário, ainda precisava ficar ouvindo um modelo metido me dizer que nenhum cara, nem na mais remota possibilidade, vai se apaixonar por mim?! Tudo tem limite né.
            Puxei a cadeira para trás, e peguei minha bolsa, olhando furiosa para ele.
            - Nina, onde você vai? – ele perguntou, franzindo a testa.
            - Onde você acha que eu vou? Eu vou sair daqui.
            Dan se levantou também, querendo ensaiar desculpas. Mas o semblante cético e zombador ainda estampava seu rosto.
            - Que isso Nini, eu tava só brincando.
            - Ah, é?, mas eu não estava. Eu realmente não sei o que fazer, Dan, e realmente esperava que você pudesse, não sei, me ajudar de alguma forma. Mas como eu sou besta em achar isso, não é mesmo?
            Comecei a sair da mesa, indo para a porta do restaurante.
            - Nina!
            Nesse ponto eu estava apenas ignorando Dan. Eu tentava ir embora, mas minha bolsa ficava prendendo em todas as cadeiras atrás de mim.
            - Vamos lá amor, me desculpa, vai? Dá uma chance pro seu Danzinho aqui? Pleaase...
            Eu por fim puxei a bolsa da última cadeira, e estava a ponto de sair dali ignorando meu amigo idiota completamente, quando alguém, aparentemente saído do nada, trombou comigo, me derrubando no chão.ima cadeira, e estava a ponto de sair dali ignorando meu amigo completamente, quando alguscondida no meu arm
            No momento da queda, por algum motivo que não sei explicar, eu consegui um breve relance dos olhos da pessoa que havia me derrubado. E, talvez tenha sido a queda, ou a luz do restaurante ou algo do tipo, mas... aqueles olhos eram... cor-de-rosa???
            Se eram ou não, não deu para saber ao certo. Pois, um segundo depois, eu sentava com a bunda no chão frio do restaurante.
            - Ai! – disse, mais pelo susto que qualquer outra coisa.
            - Me desculpa! – falou o... garçom, percebi, vendo seu uniforme. Ele carregava uma bandeja vazia, que, por algum motivo estranho, não havia desgrudado de sua mão, mesmo depois de cair.
            Todos do restaurante olhavam para mim. Era uma boa coisa meus óculos serem assim tão grandes, pois assim a visão completamente vermelha do meu rosto não era tão visível e humilhante quanto poderia ser.
            - Ah...  não tem... problema. – eu falei, tentando ignorar os olhares das pessoas e prestando atenção no rosto do garoto.
            O tal garçom era extremamente bonito. Não tão bonito quanto Dan, era verdade, mas ainda assim... era bem bonito. Seu cabelo era loiro claro, e era completamente despenteado – não do jeito despenteado-arrumado como muitos garotos usam – e sim, realmente bagunçado, de um jeito que deixava claro que ele realmente não havia encostado a mão no cabelo desde que acordara.
            E seu rosto era angular e diferente, com pequenas pintinhas sobre o nariz. Havia uma mancha curiosa sobre sua sobrancelha. Uma mancha com a forma exata de um coração.
- Eu realmente sinto muito. – ele falava. – Sou muito desastrado.
Olhei bem em seus olhos, esperando ver aquele cor-de-rosa brilhante que tinha avistado antes... mas nada. Ele tinha olhos castanhos simples como os meus.
            Que coisa mais estranha.
            - Ah, não tem... problema. – eu repeti, me sentindo uma tonta.
            O garçom se levantou, e olhou para mim.
            Bem, aquilo era mais estranho. O cara ficou simplesmente olhando para mim, como se estivesse esperando algo. Depois de um tempo sem saber bem o que fazer – e de perceber que eu estava ali, sentada no chão do restaurante – eu estiquei minha mão para o garoto esquisito.
            O garoto sorriu. Como se aprovasse o que eu acabara de fazer.
            (eu já disse que isso tudo era estranho?)
            Ele aproximou de mim e pegou minha mão... e no mesmo instante eu afastei a minha rapidamente. Isso porque um choque elétrico estalou em meus dedos, voando do meu braço para meu corpo e afundando dentro do meu coração. A exata sensação que eu tive ao mergulhar o cupido na vasilha com o mel e as flores...
            - Está tudo bem. – disse o garçom, ainda sorrindo. Ele pegou meu braço e me puxou, fazendo com que eu ficasse de pé. – Pronto, você parece estar bem agora. Vou indo, então. Te vejo... por aí.
            E com isso, o garoto colocou a bandeja numa mesa, olhou mais uma vez para mim, e, ainda sorrindo misteriosamente, saiu do restaurante. Simplesmente assim.
            Ok, isso tudo era esquisito, esquisito e es.qui.si.to!
            Eu olhei para as pessoas a minha volta, procurando um olhar tão assustado quanto o meu, mas ninguém prestava mais atenção. Olhei meus dedos, lembrando daquela sensação tão estranha, de como se um raio me atingisse, e me virei para Dan, já esquecida da nossa discussão.
            - Você acredita nisso que acabou de acontecer? – falei, me lembrando dos olhos do garçom parecerem ser cor-de-rosa e da mancha em forma de coração em sua testa.
            - Ahhh...
            - E os olhos dele... parecia que...
            - Ahh...
            - Será que eu imaginei tudo aquilo?
            - Ah...
            - Dan, você está me ouvindo?!
            Finalmente olhei para Dan... que estava me olhando fixamente.
            Sua boca estava aberta, seus braços tremiam levemente e seus olhos...
            Os olhos de Dan estavam cor-de-rosa.
            - Dan!! O que é...
            - Nina! – ele disse, quase gritando. Sua voz estava esquisita. Meio que não parecia a voz dele.
            - Ni... Nina.
            Aproximei-me dele, olhando seus olhos rosa brilharem para mim. Será que aquilo estava acontecendo mesmo? Ou será que eu havia enlouquecido de vez?
            - Dan, você está bem?
            - Nina! – Dan, olhou no fundo dos meus olhos, e juntou minhas mãos às suas. – Nina, eu... eu...
            - Você...? – eu estava ficando assustada. Dan parecia estar sofrendo um ataque.
            - Nina eu te amo! Nina eu te amo tanto! Nina, eu te amo mais do que qualquer coisa nesse mundo! Nina... Ah, Nina! Você é o amor da minha vida!!
            Nesse ponto ele estava gritando, e todo o restaurante olhava para mim mais uma vez.
            - Dan! Pare com isso, idiota! Você me assustou, sabia.
            Eu deveria ter desconfiado. Era tudo mais uma brincadeira malvada de Dan.
            - Nina, não fale assim comigo, por favor. Nina, eu te amo muito!
            Empurrei suas mãos para longe e peguei minha bolsa, que ainda estava no chão. Não acreditava que Dan ainda estava me zoando depois da nossa briga. Como ele era idiota!
            - Ni...
            - Vai se ferrar, Daniel. – falei, me virando para sair dali, mais irritada do que nunca.
            Mas novamente algo me impediu. Eu parei no ato, antes de dar o próximo passo... porque Dan estava aos meus pés, segurando minha perna.
            Eu vou dizer de novo: Dan estava aos meus pés. Seria até engraçado... se não fosse tão bizarro e completamente sinistro.
            - Dan, o que você está fazendo?!
            - Por favor não me deixe Nina! Aah, Nina, eu te adoro, eu te amo mais do que qualquer outra coisa! Por favor, não vá! Por favor Nina...
            Eu estava a ponto de dar um belo pontapé naquele modelo de cuecas de uma figa... quando percebi que Dan estava chorando. Estava realmente chorando.
            E seus olhos ainda estavam cor-de-rosa, e ainda mais rosas, graças às lágrimas.
            - Nina, por favor! Eu descobri meus sentimentos por você, agora não me deixe! Eu te amo mais que minha vida, eu amo você mais do que qualquer amor desse mundo! Por favor, por favor, diga-me que me ama também!
            Eu agachei assustada e disse: - Dan... você é gay, se lembra? O que está dizendo?
            - Não, eu estava cego antes, meu amor! Por favor, perdoe meus atos. Eu te amo, agora eu sei disso! EU TE AMO!
            Não dá para explicar como eu estava naquele momento. Não dava para decidir; se eu ficava morta de vergonha, por aquele show bem no meio de um restaurante do Pátio Savassi, se ficava assustada, por meu amigo estar chorando, aos meus pés, com os olhos cor-de-rosa, e dizendo que me amava – muito embora ele seja gay – ou se ficava lisonjeada. Porque, venhamos e convenhamos, o Dan era muito, muito gato.
            - Nina, me diga, vamos! Diga-me! Você me ama tanto quanto eu te amo? Por favor, me fale! Eu te amo, estou sobre seu feitiço Nina! Por favor...
            Então eu me liguei.
            Os olhos cor-de-rosa, as declarações totalmente piegas, o garçom esquisito, a mancha em forma de coração, o choque elétrico...
            Dan estava certo. Ele estava sobre meu feitiço.
            Ou melhor, sobre o feitiço do cupido.
            Puta que pariu.